sexta-feira, 30 de julho de 2004

o paraíso é assim. contém um quarteirão do inferno e uma esquina da corda-bamba, a geografia do paraíso é a incerteza do dia seguinte com elevações e depressões de terreno, ai de nós que precisamos de chãos firmes.
felizes de nós que pisamos nos astros distraídos.

*



oi, coração
não dá pra falar muito não
espera passar o avião
assim que o inverno passar
eu acho que vou te buscar
aqui tá fazendo calor
deu pane no ventilador
já tem fliperama em Macau
tomei a costeira em Belém do Pará
puseram uma usina no mar
talvez fique ruim pra pescar
meu amor

no Tocantins
o chefe dos parintintins
vidrou na minha calça Lee
eu vi uns patins pra você
eu vi um Brasil na tevê
capaz de cair um toró
estou me sentindo tão só
oh, tenha dó de mim
pintou uma chance legal
um lance lá na capital
nem tem que ter ginasial
meu amor

no Tabariz
o som é que nem os Bee Gees
dancei com uma dona infeliz
que tem um tufão nos quadris
tem um japonês trás de mim
eu vou dar um pulo em Manaus
aqui tá quarenta e dois graus
o sol nunca mais vai se pôr
eu tenho saudades da nossa canção
saudades de roça e sertão
bom mesmo é ter um caminhão
meu amor

baby, bye bye
abraços na mãe e no pai
eu acho que vou desligar
as fichas já vão terminar
eu vou me mandar de trenó
pra Rua do Sol, Maceió
peguei uma doença em Ilhéus
mas já tô quase bom
em março vou pro Ceará
com a benção do meu orixá
eu acho bauxita por lá
meu amor

bye bye, Brasil
a última ficha caiu
eu penso em vocês night and day
explica que tá tudo okay
eu só ando dentro da lei
eu quero voltar, podes crer
eu vi um Brasil na tevê
peguei uma doença em Belém
agora já tá tudo bem
mas a ligação tá no fim
tem um japonês trás de mim
aquela aquarela mudou
na estrada peguei uma cor
capaz de cair um toró
estou me sentindo um jiló
eu tenho tesão é no mar
assim que o inverno passar
bateu uma saudade de ti
tô a fim de encarar um siri
com a benção de Nosso Senhor
o sol nunca mais vai se pôr

*

você conhece os Detroit Cobras? pois devia.

*
notícias do front:eu podia contar o que fiz e vi, o que aconteceu, eu podia contar tanta coisa.
mas nem é preciso.

*

alguma vez você já se sentiu no centro do universo? eu já.

*

amanhã tem que fazer muito frio porque eu quero usar meu casaco peludinho.

*

- ó sol,
tu que és tããão forte
que derrete a neve
despreeeeeende meu pezinho

*

só vou te dizer uma coisa: palavras são inúteis.
eu sinto que nem um clarão que prepara pra trovoada.
tapa os ouvidos que lá vem.

*

aquele susto no corredor.
que ótimo, descobri que sobrevivo sem respirar.

*

bye bye, Brasil
a última ficha caiu
eu penso em você night and day

*

meu periquitinho verde

*

aquela aquarela mudou
na estrada peguei uma cor
capaz de cair um toró
estou me sentindo um jiló
eu tenho tesão é no mar
assim que o inverno passar
bateu uma saudade de ti

*

tão longe, um mundo d'água pra circunavegar e as caravelas com as velas furadas.

*

uma enchente amazônica, uma explosão atlântica

*

o sol nunca mais vai se pôr

*

o leito do rio fartou-se e inundou de água doce a amargura do mar

*

é tudo tão diferente na Atlântida, o continente desaparecido.

*
mas aqui também tem homem-aranha e filmes tristes.
e ontem mesmo eu ouvi a nossa canção.
eu vim pra não morrer.
eu vi um Brasil na internet.
deu pane no ventilador.

*

baby, bye bye
eu acho que vou desligar
teve um tiroteio
tivemos que evacuar o local
prometo que vou sobreviver pra te contar os detalhes.
até a volta.

sábado, 17 de julho de 2004

estou mandando uma mensagem em código, que só você pode decifrar, porque está escrita na água. (não na superfície da água, que seria muito fácil pra qualquer um, mas lá dentro do silêncio, o deep blue frio dos segredos afundados de propósito, onde nascem cracas e corais pros mergulhadores fotografarem).
minha mensagem não diz nada. só torce pra que tudo continue assim, amplos azuis e pequenas descobertas.
 

mermaid, dulac
 
 
Parecia tão inofensivo.
Brincando com fogo, ele disse. Malabares de fogo no espaço saturado de gás.
Deixa quieto.
Não deixei, explodir é efeito colateral das experiências de dominação do mundo, como sabem todos os cientistas loucos.
 
 
burn, baby
 

não fala sobre o acontecido. quem viu já sabe, quem não viu não acredita.
a verdade é relativa, os sonhos são inúteis e teve abobrinha no almoço, mas eu não ligo.
onde você se meteu?
volta logo, volta sempre. fica até mais tarde. não vai mais embora. vem ver os passarinhos.
(eles deram rasantes, acho que pra assustar. há tantos no mundo e vão voar sobre sua cabeça vezes sem conta. talvez cagar sobre sua cabeça. não por acaso, são verdes como esperanças de olhinhos vivos e te bicam mais com os olhinhos do que com os bicos).
aquilo não foi nada, esquece. não engolirei mais sapos. juro por Tara: agora só serei leve e despreocupadamente borboleta (tirando o  perigo de um sapo me engolir).
cumpre o não-prometido direitinho, preciso acreditar em você. acredita em mim. me espera que eu estou indo logo. demora um pouco, mas eu chego a tempo.
(quer dizer, o tempo é relativo, talvez tenhamos que fabricar alguma reserva de paciência).
não faz sua história andar pra trás, não é preciso. eu estive lá, estive em todos os lugares mas agora estou aqui.
me deixa entrar por esta porta sem pedir a senha, me conta tudo sobre todas as coisas que são e foram e serão, talvez. ou não fala nada importante, deixa assim, de mordidinha em mordidinha.
sabe, eu ganhei um presente.
sabe, eu recuperei o passado, desamassei as beiradas, estendi pra secar ao sol.
sabe, eu espero o dia seguinte como criança espera o Natal.

sábado, 10 de julho de 2004

ET phone home:


olhei e ele ainda estava ali. me seguiu por um quarteirão, com aqueles olhinhos entre suplicantes e dominadores de quem sabe que a presa tá no papo, e veja que nem conseguia andar direito. acho que encontrou o que procurava.
sabe quando você sabe que vai ser inevitável? que apesar dos alarmes do Departamento de Segurança foi desencadeado um processo que só acaba quando termina? parei, me abaixei, fiz um cafuné, peguei. tão pequenininho no meu colo, se aconchegando, tremendo todo, uma bolotinha embrulhada no meu casaco.
e eu me dizendo não, agora não dá, ainda não. mas você sabe, às vezes eu falo muito baixo, e por outro lado fico surda.

*

"e vocês, que virão na crista da onda em que nos afogamos, ao falar de nossas fraquezas, pensem também no tempo sombrio a que escaparam" (Aos que vão nascer, Bertold Brecht)

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alguém escapará?

*

te juro, segunda-feira passada conheci a bruxa do 61.

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já te contei que sou obsessiva compulsiva capaz de corrigir, até a auto-satisfação, a curva de um olhinho fechado que aparecerá por uma fração de segundo (que beira os limites da percepção visual humana) em uma piscada de personagem duma animação de proporções reduzidas que não vai pro Anima Mundi e sim pras telinhas mal resolvidas de monitores de 14 polegadas - enfim, um trabalho inútil? e eu GOSTO disso. eu me sinto realizada fazendo uma coisa que ninguém vai reparar.
a vida é assim, as pessoas são esquisitas.

*

o egoísmo é o efeito colateral mais previsível da overdose de psicanálise, especialmente na nossa crasse mérdia.
de vez em quando, exercitar o "abrir mão em favor de" é saudável e não provoca danos à auto-estima, como temem alguns.

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é que naquele dia eu estava sob efeito de substâncias alteradoras da personalidade, além da consciência. gás hilariante, provavelmente.

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porque é assim, no que vc mergulha no oceano das improbabilidades vai perdendo a noção dos limites, e ao perder a noção vai se embrenhando no pântano das questões insolúveis e passa a oferecer sacrifícios semanais à Grande Lacuna.

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tão linda a mãe natureza e seus raios que nos partem.

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eu canto pela rua. eu rio pro sol, pra ventania, pros desconhecidos. eu saltito às sete da manhã. eu uso roupas coloridas, e de florzinha. eu choro em desenho animado. eu não acho que os humanos devam ser extintos. eu gosto de The Doors, Fernanda Abreu, Caetano e Dick Dale. eu não quero saber de orkut. eu não agüento filme trash, site trash, programa de tv trash e música trash por mais do que uma vez (animação, quadrinho e clipe tosco eu topo). eu gosto de praia e de surfe. eu assisto futebol. eu uso cinto de segurança, paro no sinal vermelho e atravesso na faixa. devo ter esperanças de que meus amigos um dia me amarão, apesar de tudo?

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mas deixa eu te contar do Pânico. você olha e não vê, você ouve e não entende, você lê e interpreta errado, e se alguém te faz uma pergunta na lata, tipo "qual é o seu nome?", dá um branco total radiante (e não é que você não consiga falar, é que você NÃO SABE A RESPOSTA).
um estado de ET-recém-desembarcado desencadeado por situações inéditas e/ou kafkianas - nas quais ninguém te informou as instruções mas você precisa cumpri-las urgentemente - que pode durar quinze minutos, dois dias, um mês e meio. mas passa. tem que ter paciência porque passa e aos poucos você se lembra do próprio endereço ou telefone, recorda que aquele barulho é um alarme que significa "saída de carro da garagem", portanto convém prestar atenção pra não ser atropelada na calçada de novo, essas coisas.
nesses momentos de ansiedade adaptativa a boa vontade das pessoas que te cercam não tem preço. e não é pra esquecer nunca mais na vida, por isso alguns ETs mochileiros das galáxias ficam na Terra para sempre.

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eu estaria animamundando a essas horas, mas hoje tem espetáculo, tem sim senhor.

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me explica: pra que importar espontaneamente a aflição obrigatória dos estudantes de high schools ou universidades americanas, de provar o tempo todo que são "populares" através de números, se um deus gozador, que adora brincadeira, pra te botar no mundo tinha o mundo inteiro, mas achou muito engraçado etcetcetc e você pode ter amizades verdadeiras que se medem pela qualidade?
(upigreidando, era mais ou menos isto o que eu queria dizer).

*

mas falando em celebridades, conheci recentemente duas do meu acervo de admiráveis, uma na área musical outra na área quadrinhal. que me parecem pessoas muito legais, como esperava. pra um eu já pedi autógrafo (pra vender daqui a três anos por milhões de dólares, euros ou trocar por petróleo, ações de empresas de telecomunicações ou água potável). pro outro, pedirei quando for a um show, pra dobrar meu patrimônio. porque se um dia houver justiça neste mundo eles serão famosos por méritos próprios, receberão as flores (e a grana a que terão direito) em vida e poderão condicionar sua participação num evento das Organizações Globo ao cancelamento do apoio global à candidatura do Bispo Crivella à presidência.

*

cara, e pelo jeito, mais uma vez eu vou ter que votar no Qualquer Um da Silva pra tentar barrar o Crivella no segundo turno. qq 1 que provavelmente será o Cesar Maia, quem diria. e no primeiro turno, por falta de melhor opção, vou de Jandira mesmo.
que saco, sempre a mesma coisa. faz um tempão que não voto em quem acredito, aqui no Rio.
mas anular eu acho pior, os eleitores dessas catástrofes jamais anulam os seus vales-dentadura.

sábado, 3 de julho de 2004

um novo mundo se descortina para mim.
você sabia que não é permitido transitar com cavalos, burros e jumentos pela passarela do metrô?
eu nem desconfiava.


nunca tinha reparado na quantidade de gente que senta num boteco pra beber às oito da manhã.


aliás, nunca tinha reparado como há festa de rua no fim de semana, em todas as ruas.
basta uma churrasqueira, o boteco ou tendinha nas proximidades, o som na caixa (que pode ser toca-discos portátil da década de 60, rádio de carro, sonzaço semiprofissa de caixonas ribombantes ou caraoquê for), trabalhadores e desocupados a fim de exorcizar preocupações ou simplesmente cumprir o ritual de diversão do calendário e tá formado o evento.
eu sei que não é novidade, o que me espanta é a generalização de um hábito que eu pensava ser mais localizado.


pipas. como um pequeno trecho de céu pode conter tantas pipas?


e como o som que nos embala diariamente pode variar dos periquitos e maritacas sobrevoantes ao das rajadas de balas avoejantes e tudo parecer tão normal.


acho que tem uma borboleta rondando a rede onde minha atenção dormia em sono profundo.


de vez em quando eu sonho com pixels ampliados 1600 vezes ou olhinhos piscando.


minha realização absoluta vai ser quando conseguir pegar o taco de sinuca por trás do corpo, meio "debruçada de costas" sobre a mesa, naquelas jogadas com a mão esquerda. eu acho o máximo da pose sinucal, combinando com as típicas luminárias pendentes.
um dia eu chego lá.


vejo céus de azul intenso, nuvens cor-de-rosa, sóis e luas deslumbrantes no meio duma paisagem que não diria bucólica, mas que me é cada vez mais querida.


e falando em periquitos: este som me acompanha onde quer que eu vá.


Foto: Fábio Pili (www.brasiloeste.com.br) - 'Filha de uma típica família ribeirinha do rio das Mortes, menina brinca com seu periquito de estimação'.


noutro dia tinha um cara vomitando no ônibus-integração do metrô, sentado no degrau do corredor de passagem, ainda no ponto final/inicial. parecia bebum, mas não se pode afirmar sem provas. de vez em quando ele deitava no chão, ou apoiava a cabeça na perna do passageiro sentado na cadeira ao lado do degrau. e fazia aqueles barulhos ameaçadores que você sabe, e todo mundo se encolhia quando não podia se afastar mais da área perigosa.
o trocador tentou inútil e amavelmente convencê-lo a descer antes do ônibus começar a andar, mas no que ele disconcordou eu teria insistido com mais vontade. foi uma pequena grande viagem de um ponto de distância, mas nesta vida o que não se pode é reclamar de tédio.


êêêêba!!! já tenho a minha camiseta dos malvados!


não tinha reparado na quantidade de roupas que eu tenho. incluindo meu próprio brechó de coisas raras do século passado. o que posso responder quando me perguntam onde foi que eu comprei aquela blusa? que sempre existiu?


a Hannah não gosta de gato félix, e deu gritos de horror ao ver 4 gatos félixes juntos pintados de kiss naquela outra camiseta. (mas eu perdôo porque adoro mais a Hannah que a camiseta).


estou com saudades da turba ignara e do Arpoador. I'll be back. brevemente numa calçada perto de você.


os censores da ditadura militar eram tão burros quanto os programas de computador que bloqueiam sites a partir de palavras "condenadas".
censurar um cantor brega por usar algo como "você tortura minha alma" na letra foi mais que simples imbecilidade, foi um primarismo de programação.


quando vejo um pequeno poodle latindo histericamente prum pitbull, rottweiler, doberman ou semelhante, que passa indiferente às provocações pensando na própria vida, entendo perfeitamente o que acontece no mundo dos humanos, você não?


a melhor avaliação do Marlon Brando que eu vi nesses dias de homenagens póstumas foi a do Nelson, disparada.


estou achando tudo bom, até aquela comida suspeita.
(mas pra ser bem sincera, meu sistema digestivo não aprecia muito esta recaída no populismo alimentar, que fere seus princípios naturebas e/ou aristocráticos).


now the dark days are gone, and the bright days are here,
my sunny one shines so sincere


abandoned-places

abandoned places