terça-feira, 25 de novembro de 2003

Quando você dorme muito muito tarde, ou já é amanhã há muito tempo, o que que dá vontade de fazer com o vizinho que te acorda duas horas depois com som na caixa? é, né? adivinhou.
Pois juro que não despertei com ganas assassinas na manhã de domingo ouvindo a Cesária Évora. Depois Buena Vista Social Club. Depois Cesária de novo, muito tempo. Canto triste, triste, caboverdianamente triste mas lindo, que me lembrou de anos distantes.

Já corri o risco de morar e trabalhar como colaborante em educação na Guiné-Bissau, que venceu a luta pela independência junto com Cabo Verde num movimento unificado, liderado por um partido "ideal" nos meus sonhos rebeldes d'antanho, o PAIGC (mas, é claro, na prática a teoria era outra). Surgido do povo, feito de povo, para o povo, sabe como? mas com um líder que estudou na Europa e conseguiu mobilizar todas as (hoje ex)colônias portuguesas e organizar ou impulsionar partidos de libertação em todas elas, pra construir a nova sociedade partindo do zero (inclusive de recursos), retomando raízes depois de mais de quinhentos anos de dominação estrangeira. Amílcar Cabral , já ouviu falar? Minha tese de mestrado foi sobre ele, no fundo, no fundo, embora aparentemente tratasse de formas alternativas de educação em países descolonizados.

Mas morar lá, naquele tempo, tava brabo. Com filha pequena num país sem assistência médica, sem saneamento básico, cheio de mosquitinho com malária e alimentação racionada. A gente sai daqui pra ajudar e complica a vida da própria família, que não pediu pra nascer mas pede responsabilidade pra ser criada. Acabamos concordando que tinha muito brasileiro precisando de colaboração perto de casa mesmo, e muitas formas indiretas de apoiar grandes ideais.

E foi assim que conheci Guiné-Bissau e Cabo Verde apenas pelos romances da coleção Autores Africanos da Ática (Mayombe, de Pepetela, foi o que gostei mais), pelos livros, xeroxes de textos das áreas libertadas, jornais, palestras e conversas do Zé Maria Nunes Pereira, fundador do CEAA da Candido Mendes , e pela música, como a de Cesária Évora.

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